2008-01-30

Os 'critérios de sustentabilidade' não resolvem os problemas dos agrofuels

Oscar Reyes

Com a publicação do esboço da Directiva da Energia Renovável esta semana, a Comissão Europeia confirmou que planeia ir para a frente com um objectivo de 10% de utilização de agrofuels (também referidos como biofuels) nos transportes em 2020.

A controvérsia à volta desta medida intensificou-se nos últimos tempos com o europeu Joint Research Centre e o Comité Ambiental do Parlamento britânico a exprimirem ambos fortes dúvidas sobre se os objectivos propostos podem ser atingidos de forma sustentável.

Numa tentativa de diluir a pressão, o presidente da Comissão José Manuel Barroso afirmou na quarta-feira que o objectivo seria acompanhado pelo “sistema mais exaustivo e sustentável de todo o mundo para a certificação dos biofuels. Um olhar mais atento à Directiva demonstra que a maior parte das preocupações-chave em termos ambientais e sociais não são consideradas.

Os avisos mais audíveis dizem respeito ao impacto dos agrofuels sobre a segurança alimentar. Este é, em parte, um assunto de concorrência entre colheitas de comida ou de combustíveis. Em Outubro passado, Jean Ziegler, o rapporteur das Nações Unidas para o direito à comida, avisou que o desvio de terra arável para combustíveis em detrimento de comida era “um crime contra a humanidade”. Mas é o efeito nos preços da comida que pode ser o aspecto mais danoso da expansão do agrofuel. Os mais pobres do mundo gastam entre 50 a 80% dos rendimentos em comida – e é a pobreza, e não a escassez, que é a maior causa da fome.

Como resposta, a Directiva promete esforços para analisar o 'impacto da política de biofuels da UE na disponibilidade de comida nos países exportadores', incluindo os efeitos sobre os preços. Mas o simples reconhecimento dos problemas potenciais não chega perto de agir para os resolver. As sublevações relacionadas com comida no México, na Indonésia e na Índia já foram atribuídas a aumentos de preços provocados pela expansão do agrofuel. Há cada vez mais provas de que “a crescente procura de biofuels está a causar transformações profundas nos mercados agrícolas que podem fazer subir os preços de muitos produtos”, como avisam as perspectivas da OCDE-FAO (OECD-FAO Agricultural Outlook 2007-2016).

A sustentabilidade ambiental do impulso aos agrofuels também foi questionada. Com um quinto das emissões de carbono anuais a virem da desflorestação, as plantações de combustíveis em terras recém desflorestadas acabam por aumentar as emissões em vez de as diminuir. Para resolver isto, a Directiva afirma que os biofuels de terras 'de alto valor de biodiversidade' não serão contadas para o objectivo. Mas, ao fechar uma porta, abre outra. O problema não é simplesmente o facto de as novas plantações estarem a desenterrar árvores, mas também o de deslocarem outras actividades agrícolas para terras desflorestadas – uma mudança estrutural que nenhum 'critério de sustentabilidade' pode identificar.

As propostas de sustentabilidade da Comissão ficam aquém em outros assunto, sem medidas firmes para resolver o impacto dos agrofuels na degradação dos solos e na escassez de água – um problema vita para os países produtores que já enfrentam problemas gravíssimos nos seus fornecimentos de água.

Em resposta a estas preocupações, Barrosos afirmou que a UE está à espera dum 'rápido desenvolvimento de agrofuels de segunda geração'. No entanto, muitos destas tecnologias irão ser altamente controversas, uma vez que incluem técnicas para alterar geneticamente árvores e algas, pondo em riso co princípio da precaução como base para tal pesquisa.

Os assuntos sociais e laborais, entretanto, são pura e simplesmente deixados de fora dos critérios da UE. No entanto, se o actual boom de agrofuels continuar a este ritmo, avisou a Oxfam em Novembro último, milhões de pessoas enfrentarão deslocações das suas terras, ao mesmo tempo que as plantações de cana de açúcar e óleo de palma onde estas colheitas irão crescer têm um registo de standards de trabalho horríveis, incluindo a exploração de trabalho escravo. Não há propostas da Comissão para fazer face a estas implicações sociais (...)

Por estas razões, a sugestão de que os perigos dos biofuels poderiam ser mitigados pelo desenvolvimento de 'critérios de sustentabilidade' não cola. Seria, de certeza, melhor implementar uma moratória aos objectivos e incentivos à utilização de agrofuels

O autor é editor da revista Red Pepper e Communications Officer no Transnational Institute. Está, de momento, a acabar um livro sobre comércio de carbono.

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