2008-01-15

Banco Mundial acusado de arrasar as florestas do Congo

John Vidal
Guardian

O Banco Mundial, de acordo com um relatório de investigação interna efectuada por membros seniores do Banco e especialistas externos, encorajou empresas estrangeiras a explorar destrutivamente a segunda maior floresta do mundo, colocando em perigo as vidas de milhares de pigmeus congoleses. O relatório, conduzido por um painel de inspecção independente, visto pelo Guardian, acusa igualmente o Banco de induzir em erro o governo do Congo acerca do valor das suas florestas e de infringir as suas próprias regras.

As florestas tropicais do Congo são as segundas maiores do mundo depois da Amazónia, retendo cerca de 8% do carbono do planeta e possuindo uma das mais ricas biodiversidades. Cerca de 40 milhões de pessoas dependem das florestas para medicamentos, abrigo, madeira e comida.

O relatório acerca das actividades do Banco na República Democrática do Congo [RDC] desde 2002 segue­‑se a queixas efectuadas há 2 anos por uma aliança de 12 grupos de pigmeus. Os grupos alegaram que o sistema apoiado pelo Banco de atribuição de vastas concessões a empresas para explorar as florestas estava a causar um «mal irreversível».

Em poucas semanas, este assunto será discutido a nível da administração do Banco Mundial e poderá levar a uma completa renovação do modo de pensar acerca do modo como é praticada a exploração das florestas na RDC.

Este é um caso particularmente embaraçoso para o governo britânico, o qual é um parceiro de desenvolvimento do Banco e o seu terceiro maior contribuidor financeiro. Encorajou o Banco a intervir nas florestas do Congo com uma exploração industrial virada para a exportação e reservou 50 milhões de libras (cerca de 73 milhões de euros) de ajuda ao Congo para actividades florestais.

Quando o Banco voltou para o Congo em 2002, depois de anos de uma guerra que custou 4 milhões de vidas, afirmou que a actividade industrial florestal poderia contribuir fortemente para a recuperação do país. Na sua pressa de reformar a economia, inventou novas leis acerca da exploração florestal, dividiu o país em zonas e teve como objectivo a criação de um clima favorável para a exploração florestal industrial.

Mas, apesar do Banco estar legalmente obrigado a proteger o ambiente, e a tentar aliviar a pobreza, o painel descobriu que as políticas impostas ao Congo estavam a ter os efeitos sociais e ambientais opostos:

– Uma área de 600.000 quilómetros quadrados (232.000 milhas quadradas) de floresta estava reservada para empresas madeireiras;

– O Banco falhou ao não contemplar pontos sociais e ambientais críticos;

– Ignorou entre 250.000 e 600.000 pigmeus que se crê viverem nas florestas congolesas, apesar da sua presença ser bem conhecida e estar bem documentada;

– Colocou os pigmeus numa situação de perigo potencial.

Existem criticas às reformas que o Banco impôs em troca dos empréstimos de mais de 450 milhões de dólares [cerca de 360 milhões de €]. Inicialmente, afirmou o painel, «o Banco providenciou [ao governo] estimativas de lucros de exportação das concessões de exploração florestal que se revelaram demasiado altos. Isto encorajou a que se desse especial atenção à reforma do sistema de exploração florestal à custa da procura de formas de usos sustentáveis das florestas, do potencial que as florestas possuem para as comunidades e da sua conservação.

«Na maior parte dos casos, os beneficiários destas reformas têm sido as empresas estrangeiras ou empresas locais controladas por estrangeiros», constata o relatório.

Numa análise sarcástica acerca do raciocínio económico do Banco, o painel afirmou que o Banco «distorceu o valor económico real das florestas do país» ao olhar apenas para os impostos e lucros que a crescente actividade industrial florestal poderia gerar. «Parece ter havido pouca acção para apoiar usos alternativos dos recursos florestais», disse.

O grupo viajou para o interior profundo da floresta com a finalidade de obter provas das comunidades dos pigmeus, as quais afirmaram que não foram consultadas antes do Banco ter lançado as suas vastas reformas de exploração florestal.

Um líder dos pigmeus disse ao painel: «Estão a empobrecer-nos a todos os níveis… as companhias [madeireiras] impedem­‑nos de ir para as florestas». Outro disse que a companhia já havia comprado as terras para que as pessoas não pudessem ir mais para as florestas.

«As estradas estão a entrar cada vez mais para o interior das florestas, abrindo-as. Cada vez mais estamos a ser privados da nossa comida e medicamentos. Nunca vimos nada do Banco a não ser promessas», afirmou um terceiro.

O ano passado, investigações efectuadas por grupos não governamentais mostraram que 12 empresas detidas ou controladas por estrangeiros foram encorajadas pelo Banco a dominarem toda a indústria. Algumas possuíam concessões de mais de 5 milhões de hectares e todas incluíam comunidades de pigmeus nas suas possessões. O governo está a rever a legalidade de muitas destas concessões.

Ontem, grupos internacionais que trabalharam com comunidades congolesas afirmaram que se encontravam chocados com as descobertas feitas pelo painel.

«Os pigmeus têm de estar inteiramente envolvidos no desenvolvimento de quaisquer planos futuros para a floresta, e o Banco precisa de encontrar meios de os ajudar a fazer valer os seus direitos, ao invés de ajudar empresas madeireiras a destruí-los», afirmou Simon Counsell, Administrador da Rainforest Foundation [Fundação Floresta Tropical].

«O Banco Mundial deve mudar urgentemente as suas políticas florestais. A exploração industrial de florestas não está a contribuir para a redução da pobreza, ao passo que a sua expansão mina benefícios financeiros futuros por serviços ambientais», afirmou Staphan Van Praet, o defensor da floresta africana, da Greenpeace International.

Traduzido por Bruno Teixeira
infoalternativa

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